Brasileiro saca mais de R$ 1 tri da poupança

Os sinais de fraqueza da economia, com crescimento nulo e inflação elevada, já provocaram estragos até mesmo nos números da caderneta de poupança. Diante da escalada dos preços e dos juros ao consumidor, que estão no maior patamar em três anos, parte dos consumidores não consegue pagar as contas do mês. Atolados em dívidas, eles recorrem às economias para não entrar no vermelho.
Apenas em 2014, o volume de saques da caderneta chegou a R$ 1,032 trilhão, o maior montante já resgatado da aplicação na história. Mesmo se comparado a 2013, ano até então com maiores saques, os números impressionam. Em oito meses, os brasileiros retiraram da poupança nada menos que R$ 150,1 bilhões a mais que o registrado um ano antes. Não por acaso, o saldo da caderneta despencou.
Em agosto, a captação líquida (depósitos menos resgates) fechou no azul em apenas R$ 518,3 milhões. Um ano antes, essa conta estava positiva em R$ 4,6 bilhões, a queda, portanto foi de 89%. Os resultados do mês, divulgados ontem pelo Banco Central (BC), são os piores para agosto desde 2006, quando o saldo da poupança foi negativo em R$ 280,3 milhões.
Mas ainda pode piorar. “A tendência a curto prazo não é de melhora, muito pelo contrário”, disse o economista Miguel de Oliveira, da Associação Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac). “Você tem um ambiente de inflação mais alta e juros no maior patamar em três anos. Esses fatores combinados produzem efeito perverso na renda das pessoas, porque acaba faltando salário no fim do mês”, explicou.

Alternativa
Quando isso ocorre, há, em geral, duas opções: reduzir despesas do dia a dia, o que nem sempre é possível, ou conseguir mais dinheiro, seja com parentes, via empréstimo bancário ou recorrendo às economias guardadas na caderneta. As estatísticas do BC dão uma dica do que possa ter ocorrido.
Até agosto deste ano, o saldo da poupança encolheu quase R$ 30 bilhões quando comparado ao registrado nos primeiros oito meses do ano passado. No acumulado de 2014, a captação líquida está positiva em R$ 14,1 bilhões, o menor resultado para o período desde 2011, quando os depósitos superaram os saques em R$ 5,3 bilhões.
O que pode explicar parte desses resultados, dizem especialistas, é o baixo desempenho econômico. “Quando você tem um ambiente de maior dificuldade financeira, como o país vive hoje, isso tem um impacto direto na poupança”, emendou Oliveira.
Os números não deixam margem para dúvidas: à medida que o Produto Interno Bruto (PIB) perdeu força, o saldo da caderneta encolheu. Até o ano passado, mesmo com o país crescendo menos do que em períodos recentes, a poupança ainda registrava resultados fortes. Entre janeiro e junho de 2013, os depósitos na poupança superaram as retiradas em R$ 28,3 bilhões. Este ano, já com o país em recessão, o saldo acumulado despencou para R$ 9,6 bilhões — uma diferença de 66%.

Preços nas alturas
A escalada da inflação também joga contra a caderneta, diz o professor Silvio Paixão, da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi). “À medida que os preços sobem, piora ainda mais o cenário para a poupança”, assinalou. Apesar de isenta de Imposto de Renda (IR), a aplicação tem rendimento prefixado, estipulado em 0,5% ao mês (6,16% ao ano), mais a correção da Taxa Referencial (TR).
Enquanto isso, os preços sobem sem parar. Nos últimos 12 meses até julho, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) avançou 6,5%. “Quer dizer o seguinte: hoje, na média, a poupança apenas empata para a inflação. Mas, como os preços são voláteis, há períodos em que a caderneta nem mesmo corrige os valores depositados pelos poupadores”, observou.
O professor é enfático: “Na atual conjuntura econômica, quem tem dinheiro guardado na caderneta corre o risco de ver o patrimônio encolher”. A saída, ele disse, é pesquisar outras opções de aplicação, como fundos de investimento ou até mesmo a bolsa. Mas com cautela. “Antes de tomar qualquer decisão, é importante procurar um bom especialista”, recomendou. “A bolsa, mesmo tendo subido recentemente, é um território de riscos elevados.”
Já os fundos de investimento, que ganharam com a recente alta dos juros, também têm de ser bastante observados. Simulações feitas por especialistas mostram, por exemplo, fundos que cobram taxa de administração acima de 2%. Com isso, podem, em boa parte dos casos, entregar rendimento ainda menor que a poupança. “Para não perder dinheiro, é preciso fazer conta e pesquisar bastante. Porque a vida do investidor, hoje no país, não está nada fácil”, sentencia Paixão.
Fonte: Correio Braziliense

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